Hiroshima, Meu Amor
A nouvelle vague, termo francês para “nova onda”, foi um movimento artístico cinematográfico ocorrido na França, no fim dos anos 50 e durante a década de 60. Cansados do peso dado ao roteirista pela escola do realismo poético francês, os realizadores dessa nova geração buscavam um cinema autoral, na qual o diretor e seus anseios criativos tivessem prioridade na execução do filme.
O que caracterizava as obras dessa geração era a intransigência com a qual eles tratavam as normas tradicionais do cinema, tanto estética quanto politicamente, e a abordagem de temas primordialmente pessoais, como, por exemplo, o amor. Um dos filmes essenciais dessa revolução é Hiroshima, Mon Amour (1959) – Hiroshima Meu Amor – dirigido pelo cineasta Alain Resnais.
Tendo dirigido curtas-metragens durante toda sua vida, Resnais recebeu uma proposta para fazer um filme que tratasse do ataque nuclear à cidade de Hiroshima, Japão, no ocaso da Segunda Guerra Mundial. O interesse dos produtores surgiu após o sucesso de um dos curtas do diretor, “Noite e Neblina”, que tratava dos horrores promovidos em campos de concentração nazista durante a guerra. Inicialmente, a ideia era fazer um documentário sobre a bomba atômica e o legado de sofrimento que ela deixou. Porém, em conversas com a roteirista do filme, Marguerite Duras, o realizador optou por retratar uma história simples, sobre conflitos amorosos, cujo pano de fundo seria a cidade destruída pela bomba.
Hiroshima Mon Amour conta a história de uma mulher francesa (interpretada por Emmanuelle Riva, que, em 2013, foi a artista mais velha a ser indicada ao Oscar de Melhor Atriz, pelo filme “Amor”) e um homem japonês (Eiji Okada), que estão tendo um caso amoroso. Ele é nativo de Hiroshima, lutou na guerra e teve sua família destruída pela bomba. Ela é atriz, e está no Japão para as gravações de um filme pacifista sobre a guerra. Ambos são casados e estão traindo seus cônjuges.
Porém, de repente, ela diz que irá voltar à Paris no dia seguinte e que nunca mais quer vê-lo. O homem, que se deixou apaixonar por ela, não aceita o fato de nunca mais vê-la e faz de tudo para conquistá-la nas últimas horas dela no Japão. Em uma longa e brilhante cena em um bar, a mulher conta a ele o motivo de seu comportamento em relação a ele, com diversos flashbacks permeando a conversa. Durante a guerra, ela teve um forte romance com um jovem soldado alemão, o qual ela própria definiu como seu primeiro amor. O tórrido romance foi destruído com a morte do soldado, em combate, nas margens do rio Loire, em Nevers, cidade natal da protagonista. A dor do amor perdido e a repreensão de sua família (por conta da invasão alemã à França) acabaram por devastar a mulher.
Hiroshima, Mon Amour é uma obra sobre, acima de tudo, o esquecimento. Enquanto o homem luta para esquecer os horrores da guerra e a morte de sua família, ela luta para esquecer seu grande amor e a dor que a mera lembrança de sua cidade natal causa. Aí está o paradoxo que corrói a jovem francesa: ela está sofrendo porque está esquecendo o alemão, pois ela ainda o ama profundamente, e ela quer, também, esquecê-lo, para dar um fim ao seu sofrimento.
Quando o japonês luta por ela, a moça vê a possibilidade de um novo amor que, um dia, pode ser esquecido. E, em uma grande sacada, Resnais ambiente essa história em uma cidade que quer, mas que nunca conseguirá esquecer o que nela ocorreu. A conclusão do filme mostra a redenção da mulher, que aceita, finalmente, que o esquecimento é um processo natural da vida de qualquer ser humano, principalmente no que diz respeito a sentimentos e sensações. Ela, enfim, abraça o fato de que seu amor de juventude acabou, e não voltará mais. E abraça o fato de que, um dia, o sentimento que sente pelo jovem japonês também será esquecido e guardado em algum lugar de seu coração, fundido à imagem da cidade de Hiroshima; assim como seu primeiro amor foi fundido à imagem de Nevers. Sua grande conclusão é a de que não adianta ela se agarrar à margem do rio Loire. O que ela deve fazer é de desprender, e deixar sua vida correr livremente, assim como as águas do rio.
O filme foi aclamado em sua época, e resiste até hoje como um dos filmes mais belos e originais que o cinema já produziu. O uso inovador de flashbacks causou forte impacto no meio cinematográfico, e até hoje o roteiro da obra é estudado e apreciado como um grande marco. Resnais, logo em seu primeiro longa-metragem, produziu um filme atemporal, com o qual toda e qualquer pessoa que já amou sofreu por amor pode se identificar. Sua decisão de não dar nome aos dois personagens do filme universaliza o filme, tornando-o uma fábula perfeita sobre os efeitos que o amor, e sua perda, causam nas pessoas.
O cineasta francês François Truffaut, outro expoente da nouvelle vague, disse assim, se referindo ao filme de seu amigo Alain:
“Uma vez que você viu Hiroshima Mon Amour, se torna impossível fazer filmes da mesma maneira que você costumava fazer”.
E você, já assistiu ao filme? Deixe suas opiniões nos comentários abaixo.
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O filme de estreia de Alain Resnais ainda produz o mesmo impacto que produzia há quase sessenta anos: uma obra simples e bela sobre o amor, definidora de um dos mais importantes movimentos da história do cinema.
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IMDb
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Roteiro
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Elenco
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Fotografia
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Trilha Sonora
1 comentário
Lindo texto sobre o filme.
Me deixou com uma sensação de nostalgia mesmo eu nunca tendo vivido tal amor kkkkkkkkk
Irei assistir o filme, com certeza, pois essa aceitação de que o esquecimento é natural, saudável e necessários é algo que eu admiro muito.
Sinto que vou adorar o filme, muito obrigada pela resenha :B